04 agosto 2011

A Culpa é dos Pais...

UM DIA, ISTO TINHA DE ACONTECER  Texto de Mia Couto

Existe uma geração à rasca?
Existe mais do que uma! Certamente!
Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida.
Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.
A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo.
Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.
 Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.
Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1.º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.
Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.
 Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego, ... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.
Foi então que os pais ficaram à rasca.
Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.
Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.
São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.
São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!
A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.
Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.
Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.
Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere.
Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.
Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.
Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.
Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.
Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.
 Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração?
Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!
Os jovens que detêm estas capacidades-características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).
Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja!, que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.
E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!
Novos e velhos, todos estamos à rasca.
Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.
Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.
A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la.
Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam.
Haverá mais triste prova do nosso falhanço?


28 maio 2010

Futebol de 7: Tática 1-3-2

Hoje vou "inventar" um novo esquema tácito. Pode ser um posicionamento de risco mas no "papel parece dar certo". Em primeiro lugar devo salientar que o que aqui digo são "coisas que me passam pela cabeça", são meras opiniões que carecem da "douta aprovação das mentes iluminadas" mas, todos vemos nos dias dos jogos, os miúdos dispostos no campo em esquemas tácitos mais ou menos diversos e, ainda que partindo de um tronco comum,  todos eles assentam por vezes em pressupostos errados: ou a tipologia técnico/física dos praticantes não é a indicada para o  esquema escolhido; ou se colocaram os miúdos em posições que estes não dominavam porque ainda na véspera do jogo estavam a treinar noutra posição diferente; ou porque o treinador preparou os jogos  e os "leu" no campo de uma forma um pouco displicente não considerando as capacidades/fragilidades da equipa  adversária... (já vi uma equipa fraquinha jogar com 2 defesas contra outra muito mais forte, para na semana seguinte a ver jogar com 3 defesas contra uma adversária mais fraca).
É natural que miúdos de 8/9 anos não têm a capacidade  nata de saber interpretar toda a dinâmica do jogo, de saberem se movimentar no campo. Então, lá deve estar o treinador para corrigir pontualmente o que não está a correr bem, mas para isso os jogadores terão de reconhecer a verdadeira voz de comando (mas o reconhecimento da voz de comando do treinador é outro assunto...).
Voltando à minha proposta de esquema táctico: O DC poderá ser um jogador que, não tendo muitos dotes técnicos precisa de "varrer a sua zona" , socorrer nas dobras, jogar em antecipação e marcar um avançado. Se for tecnicamente evoluído tanto melhor pois pode sair a jogar.
Os MD e ME deverão ser rápidos e resistentes para poderem fazer o papel de defesas laterais e também apoiar o ataque.
 O MC deverá ser resistente fisicamente para poder apoiar o ataque e apoiar os laterais quando estes defendem, deverá conseguir colocar bem as bolas pelo ar e pelo chão nos avançados e chutar bem fora da área. Se possível saber jogar de cabeça. 
Os AD e AE tanto poderão vir ao centro ou cair nas alas. Este esquema pode facilmente desdobrar-se num 4-2 ; 4-1-1 ou 3-2-1 quando a equipa defende. Tem a vantagem de ocupar bem o campo deixando espaços para as movimentações de 2 para 1; é fácil de interiorizar pelos miúdos; pressiona a equipa adversária mais à frente, mas precisa de um banco equilibrado. 
Esta é a minha "receita" só tenho pena de não a poder "provar" .

27 maio 2010

Futebol de Formação: "Escolas de Futebol" ... Porquê?

Os miúdos de hoje deixaram de "frequentar as ruas" para brincar. Primeiro passam mais tempo nos infantários, nas escolas, nos  ATL's. Segundo tem os computadores, as "boxes" e as televisões. Terceiro deixou de ser seguro frequentá-las.
No meu tempo... e noutro bem mais recente, "a malta", nos intervalos da escola ou quando faltava algum professor, aproveitava para dar uns "toques na bola" e ao final da tarde, entre o lanche e o jantar, reunia-se  na rua com menor declive das redondezas, onde com quatro pedras se faziam as balizas... Se alguém chegasse mais tarde tinha sempre lugar entrando para a equipa que estivesse a perder e, da mesma forma que tinham chegado iam partindo para casa por serem horas do jantar ou respondendo ao chamamento das mães.
Nesses tempos era na rua que se tinham os primeiros contactos com o futebol no 2x2, no 3x3, no ... 6x7.
Hoje as "ruas" foram substituídas pelas "Escolas de Futebol"... mas era nas ruas que se aprendia a dominar a bola, a passá-la e a fintar.
No entanto, na minha opinião e sobre o que me é dado observar, o 1x1, o 2x2, são pouco praticados pelas escolas de futebol. 
Com o incentivo do golo em balizas pequenas e espaços reduzidos potencia-se o domínio da bola e o passe. Só depois de bem interiorizada a relação próxima com a bola se deveria passar para esquemas mais complexos.
A Escola de Futebol veio dar um ar mais formal ao que dantes era natural nos miúdos: o "jogar à bola". A Escola de Futebol com as camisolas vistosas,  o calçado apropriado à relva sintética e os esquemas de treino elaborado veio substituir a roupa suada e suja, os sapatos esfolados e o alcatrão ou terra das ruas deste país mas, ao mesmo tempo veio retirar aos miúdos a camaradagem, a descontracção,  a alegria e a ilegalidade do "jogar na rua".